quarta-feira, 29 de setembro de 2010
terça-feira, 21 de setembro de 2010
a ti Desejo te
O homem dentro do terno,
mata
Há muito, mata.
O seu terno, uma couraça
Em seu peito um cora-cão.
O homem dentro do velho,
treme
Há muito teme.
Em seus pelos muitas cãs
Da sua cova, um medo insão.
Se é terno somente a veste
Não o sentir de quem o
veste
O manto afasta o abraço
fraterno
Se mata, o verbocídio
O ato-fato, a ceifa do nome
da seiva
A folha falha, espalha,
palha
Se o chão é cova
Um passo em falso
O alçapão
Se a cã se espalha
O branco embaça
A nula ação
Pausa... Preencho, invento,
a ti dôo:
Uma manta-térnica
Um arte-fato
Um chão-colchão
Uma florida-mata...
Uns, dois, três, alça-pães
Aos ares, doces e amores!
Mil cãs-can-cans
Pernas e pelos em cores!
Um cão-cantinho-bichinho
Em teu regaço, eu quentinho
quinta-feira, 16 de setembro de 2010
quarta-feira, 15 de setembro de 2010
terça-feira, 14 de setembro de 2010
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
quarta-feira, 8 de setembro de 2010
A Poesia 3
Um bom poema é aquele que nos dá a impressão de que está lendo a gente... e não a gente a ele.
Mario Quintana
Presenteado por Laura Geszti
A Poesia 2
Podemos supor que boa parte do trabalho intermediário executado durante a formação de um sonho, que procurar reduzir os pensamentos oníricos dispersos à expressão mais sucinta e unificiada possível, se processa segundo a orientação de encontrar transformações verbais apropriadas para os pensamentos individuais. Qualquer pensamento, cuja forma de expressão parece estar orientada para outros motivos, atuará de maneira determinante e seletiva sobre as possíveis formas de expressão atribuídas aos outros pensamentos, e poderá agir assim, talvez, desde o próprio começo - como é o caso no compor um poema. Se um poema tiver que ser escrito em rimas, o segundo verso de uma copla é limitado por duas condições: deve expressar um significado apropriado, e a expressão desse significado deve rimar com o primeiro verso. Sem dúvida, o melhor poema será aquele em que deixarmos de notar a intenção de encontrar uma rima, e no qual os dois pensamentos tenham, por influência mútua, escolhido desde o início uma expresssão verbal que permita surgir uma rima com apenas um ligeiro ajuste subsequente.
(Interpretação dos sonhos, Vol. V, p. 362, 1900)
Sigmund Freud
Presenteado por Maria Clara Queiroz Corrêa, minha mãe
A Poesia
(...) a maior parte dos acontecimentos é inexprimível e ocorre num espaço em que nenhuma palavra nunca pisou.
Cartas a um jovem poeta - Rainer Maria Rilke
Presenteado por Laura Geszti
domingo, 5 de setembro de 2010
Negro Cor
Para João Do Corujão
Nosso negro cor
Nosso negro raça
Nosso negro dor
Nosso negro graça
Tu um preto claro
Ele um negro escuro
Eu um preto cinza
Ele um negro azul
Nosso negro mouro
Eu um preto mouro
Vosso negro Otelo
Triste negro Otelo
Nosso negro gato
Nosso negro Gil
De que melodia
O negro surgiu ?
Em que melodia,
Em que dia ou noite foi
que se fez o negro?
Em que dia ou que
noite, em que data foi
Que perdeu-se o negro,
A partir de quando não
fomos mais gente,
E sim vermelhos
amarelos e negros e brancos,
Fomos diferentes?
Negro
pela rua
Preto
em cada esquina
Nosso preto luto
Luta pela vida
Negro pelo mundo
Black Power, Zulu
Versos rastafari
Correm pelo mundo
Pele tão morena,
Cor-de-pele negra
Pele da tigreza
Deusa de unhas negras
Nosso negro gato
Nosso negro Gil
De
que melodia
O
negro surgiu?Para ouvir:
Hai-kai-kaidinho-por-você
Ai, ai, ai, I'm waiting
Ai, ai, ai, I'm waiting
Tô desejando uma palavra tua
Tô esperando te encontrar na rua
Tô esperando uma palavra tua
Tô desejando te encontrar na rua
Mal-nu-scrito
Até
quando agüentaríamos tal intimidade – suportava ainda a mim, que
te adivinhava cada suspiro?
Suportava
eu ainda a ti?, tornava-se mais, a cada dia, névoa da manhã fria,
reflexo meu embaçado.
Confundiam-se
nossas imagens.
Era
a hora: a ausência, o afrouxar de mãos, o esquecimento - em algum
breve instante no futuro - dos nossos gostos e dos nossos cheiros.
Me
deste muito, em especial tua juventude; eu, para ti, arranquei de mim
o que de melhor havia. Confesso, dei-me também em contraponto. A
contragosto, meus piores matizes.
Perdoa-me,
sou destas criaturas de sangue, que um dia morrem, e que por
vezes fazem filhos. Pudera conter em mim, mesmo que em pequeníssima
parte, divina porção. Limitado sou, porém, por destino trágico,
às formas dos seres de carne. Sou filho dos filhos de outros filhos.
Das Mortes
A
pior morte sofri intensamente.
Léo
morreu aos vinte e três. Canceroso, aos poucos. Doeu-me doído
quando soube, já quase no fim, de que ele não mais reconhecia as pessoas. Ali, o perdi. Alguns dias mais, morreu.
As
últimas imagens em que o tenho é dele ainda gordo. Ainda sorriso.
Mulherengo. Tenso. Amável. Amigo, barbudo e gordo.
Mudaram-se,
a família com ele, para Belo Horizonte, em certo momento da doença.
Lá, definhou. Cidade de belo nome e de terrível destino para meu
querido amigo.
Guardo
em meus olhos o Léo carioca, o Léo gordo. Ou em meu coração, o
que dá no mesmo.
Senti
muitos medos da morte. Certa vez, entretanto, pressenti algo muito
mais poderoso, sombrio e paralisante: o medo da vida. Este, às vezes
me visita. Há que ser muito vivo demais para combatê-lo,
exterminá-lo, matá-lo. Antes.
Meu
cachorro tinha o nome da paz: Shalom.
Shalom
foi estraçalhado por outro cachorro.
Chorei
muito, alguns meses depois, em uma noite de insônia.
Não
sinto, não teria como, saudades da sua voz ou de suas palavras.
Essas saudades sentimos das gentes (às vezes ouço Léo cantando). O
que me faz falta (o que me fez falta naquela noite sem sono) é do
Shalom no meu colo, eu afagando o peito dele, o calor, os pelos, a
sua pequena língua beijando meu nariz.
Shalom
vive na minha pele.
Minha
avó se foi após duas semanas na UTI e oitenta e dois anos no mundo.
Na ocasião desejei que ela vivesse em algum lugar miserável, longe,
desassistido. Teria se livrado dos tubos, dos fios e dos danos da
UTI.
Minha
avó nunca foi a avó abrigo, abraço de tudo e de todos. Mas foi a
que eu tive, a única, e ela me amava, e eu a amei, a mãe da minha
mãe.
O
pai da minha mãe se foi quando eu ainda não tinha nascido. Não o
posso recordar. Era médico, tomou remédios.
O
pai do meu pai também era médico, sua esposa, “do lar”. Os dois
há muito deixaram de ser. A mim, mal foram. Afastados, em outro
país, de onde um dia meu pai fugiu. Os tive apenas através de vozes
em telefones, alguns retratos, cartas.
Telefonemas,
retratos e cartas. Sem cheiros ou calores.
Creio
ter conhecido mais ao Shalom do que estes dois amados avós meus.
Espécie
de pré-morte a que meu pai experimentou, em sua juventude. Aos
dezenove saiu de sua casa, de seu país, de seu pai, de sua mãe, de
sua irmã. Aos pais nunca mais os teve em seus olhos; restou
avistá-los com o coração.
O
filho afastado de seus pais, para sempre. E sempre é muito.
Pensava
diferente do era permitido ser pensado naquela ilha que era o país
dele.
Um
acontecimento aliviou tantas dores: a irmã de meu pai veio ao nosso
encontro, turista de poucos dias, tia que eu sempre quis, meu pai
exultante, minha tia risonha, no oculista, eu feliz, mesmo o oculista
compartilhava tamanho contentamento...
(no
meio de uma noite, adolescente, acordei, chorando, com pena de meu
pai. Queria consolá-lo. Fui ao seu quarto. Eu estava triste, ele
dormindo. Acordei-o, expliquei a minha revolta, o filho que tomava as
dores do pai. Ele me olhou, constrangido, confuso, quase irritado.
Acho. O passado é pouca lembrança e muito esquecimento. O que me
recordo, de modo difuso, é de minha mãe me acarinhando e me
conduzindo de volta à minha cama)
...
fomos eu e meu pai ao oculista, levar minha tia para fazer um par de
óculos novos, muitos anos depois daquela noite entre parênteses.
Deve-se
sempre enxergar muito bem, mesmo que seja apenas por duas semanas.
Minha
tia passou a ver melhor lá em seu país, e eu a bebi com os olhos
naquelas duas semanas em que aqui esteve.
Na
minha família sou o único que nunca usou óculos. Ainda assim, era
medroso o meu olhar.
Olhar
bem olhado, beber e comer com os olhos. Olhar em outros olhos. Viver
com outros olhos.
Após
o coração da minha avó parar e seus olhos não mais se abrirem,
encontramos, dias depois, em sua casa, embrulhados, um par de óculos
novos. Ela os havia encomendado. Não chegou a usá-los.
Nas
UTIs não se usam bem os olhares.
Rio
de Janeiro, 08/01/98, 01:30 a:m
Rio
de Janeiro, 05/09/10, 02:25 a:m
Rio de Janeiro, 31/03/11, 23:23 p:m
Rio de Janeiro, 31/03/11, 23:23 p:m
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